Na manhã de quinta-feira (19 de dezembro de 2024), o tribunal de Avignon, na França, emitiu sua sentença para Dominique Pelicot, acusado de drogar e estuprar repetidamente sua ex-mulher, Gisèle Pelicot, durante um período de 10 anos. O caso, que gerou ampla repercussão internacional, resultou na condenação de Pelicot a 20 anos de prisão, pena máxima para o réu, que confessou os crimes durante o julgamento. A sentença foi vista como um marco na luta contra a violência sexual, especialmente por parte de figuras próximas, como cônjuges e parceiros.
Contexto do caso
Gisèle Pelicot e Dominique foram casados por 50 anos. A história de abusos e estupros foi revelada publicamente por Gisèle após a prisão de Dominique em 2020, por outro crime de importunação sexual. Durante a investigação, a polícia encontrou fotos e vídeos no computador de Pelicot, nos quais Gisèle era vista sendo drogada e estuprada por diferentes homens.
Dominique Pelicot foi acusado de dopar sua esposa com tranquilizantes ao longo de 10 anos. Ele misturava os medicamentos na comida e bebida de Gisèle, sem o seu conhecimento. Após sedá-la, ele convidava outros homens, geralmente via sites de encontros, para estuprá-la, e filmava os crimes. O número total de abusos registrados supera 200, envolvendo mais de 70 homens, com idades variando entre 21 e 68 anos.
Sentença
O tribunal francês condenou Dominique a 20 anos de prisão, a pena máxima prevista para os crimes de estupro agravado, que envolvem violência, manipulação e outros fatores que agravam a conduta criminosa. Além disso, os outros 50 réus que participaram dos abusos também foram julgados e condenados. Suas penas variaram entre 3 e 15 anos de prisão, dependendo da gravidade de sua participação no caso.
- Dominique Pelicot: condenado a 20 anos de prisão por estupro agravado e outros crimes relacionados, como sedação e exploração sexual.
- Outros 50 réus: as penas variaram entre 3 e 15 anos de prisão, com a maior pena aplicada a Romain V., de 63 anos, acusado de estuprar Gisèle em seis ocasiões diferentes e sendo soropositivo (apesar de não ser considerado um risco de contágio devido à baixa carga viral no momento dos crimes).
Reações à Sentença
A sentença gerou reações contrastantes. Muitos manifestantes e ativistas feministas, presentes no tribunal e nas imediações, celebraram a condenação de Pelicot, mas expressaram decepção com as penas mais brandas dos outros réus, considerando que elas estavam abaixo do esperado. Durante a leitura das sentenças, o público presente vaiou a decisão para alguns dos réus, especialmente os que foram libertados ou receberam penas mais leves.
Gisèle Pelicot, após a leitura da sentença, falou com a imprensa e reafirmou sua coragem por ter exposto publicamente o caso. Ela afirmou que fez isso por seus filhos e netos, e para trazer à tona a luta contra a violência sexual silenciosa que muitas outras vítimas enfrentam, geralmente nas sombras. Gisèle destacou que sua decisão de tornar o julgamento público foi para “fazer a vergonha mudar de lado”, referindo-se à necessidade de responsabilizar os agressores e não as vítimas.
Detalhes sobre os Crimes
De acordo com as investigações, Dominique Pelicot não apenas abusou de Gisèle, mas também filmou os estupros. Ele incentivava os agressores a não acordá-la durante os atos, para que ela permanecesse inconsciente. A manipulação psicológica foi uma constante, já que Gisèle, sem saber, foi sedada repetidamente durante uma década.
Além disso, a violência não se limitava apenas aos abusos sexuais. Em um dos depoimentos mais chocantes, Gisèle revelou que, durante anos, ela foi “sacrificada no altar do vício” do marido. A relação deles se tornou uma tortura, e ela foi forçada a lidar com os traumas de ser repetidamente abusada e filmada, sem a possibilidade de agir ou reagir.
O Impacto da Revelação Pública
A revelação pública do caso teve um grande impacto social e político. Gisèle Pelicot se tornou uma voz potente na luta contra a violência sexual e doméstica, especialmente em casos onde as vítimas são manipuladas e abusadas por pessoas de sua confiança, como parceiros e cônjuges. Ela não apenas expôs a própria dor, mas também se tornou um símbolo para outras mulheres que sofrem abusos semelhantes, muitas das quais têm medo de denunciar.
O caso de Gisèle Pelicot também trouxe à tona a questão da impunidade e das sentenças muitas vezes brandas para crimes de abuso sexual. Durante o julgamento, vários réus alegaram que não sabiam que Gisèle estava dopada, mas outros, incluindo Dominique, afirmaram que todos os envolvidos sabiam que ela estava inconsciente.
O Futuro do Caso
Após o veredito, a advogada de Dominique Pelicot, Beatrice Zavarro, anunciou que ele está considerando recorrer da sentença. O réu e os outros condenados têm até 10 dias para apresentar apelação. Enquanto isso, o caso continua a gerar discussões sobre a responsabilidade judicial e a necessidade de endurecer as penas para crimes sexuais, especialmente em casos de estupro em série envolvendo manipulação e sedação.
Repercussão Internacional
O caso de Dominique Pelicot ganhou atenção internacional, com vários meios de comunicação cobrindo o julgamento de forma abrangente. As imagens das manifestações em apoio a Gisèle Pelicot, que levantaram cartazes com mensagens como “A culpa muda de lado”, ecoaram nas redes sociais, dando visibilidade à luta contra o abuso sexual e a violência doméstica.
Além disso, especialistas em psicologia e criminologia têm analisado o perfil de Dominique Pelicot, destacando sua manipulação e controle sobre a vítima, assim como a natureza sistemática dos abusos. Psicólogos sugerem que ele possuía características de um agressor sexual planejado e manipulado, que usou a confiança de sua esposa para cometer os crimes de forma meticulosamente calculada.
Conclusão
A condenação de Dominique Pelicot, juntamente com a sentença de outros 50 réus, representa um passo significativo na luta contra o abuso sexual e a violência doméstica na França e no mundo. A coragem de Gisèle Pelicot ao tornar o caso público trouxe à tona questões cruciais sobre o abuso sexual, a responsabilidade dos agressores e a importância de apoiar as vítimas na busca por justiça.
Este caso reforça a importância de uma abordagem mais rigorosa em relação à justiça penal para crimes de abuso sexual e destaca a necessidade urgente de mudanças estruturais no tratamento das vítimas de violência doméstica. Gisèle Pelicot, ao transformar sua tragédia em um movimento de conscientização, proporcionou um exemplo de resistência e força, desafiando um sistema que frequentemente falha em proteger as vítimas de abuso.