Na investigação que resultou na revelação de uma tentativa de golpe de Estado no Brasil, conduzida após as eleições de 2022, dois militares de alto escalonamento se destacaram por sua postura firme e se dedicaram às ações golpistas. O general Marco Antonio Freire Gomes, comandante do Exército, e o tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, comandante da Aeronáutica, foram figuras-chave que resistiram à pressão para aderir ao golpe e impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva ( PT).
O Relatório da Polícia Federal
O relatório da Polícia Federal (PF), divulgado pelo ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF), descreve uma tentativa de golpe que visava manter Jair Bolsonaro no poder e comprometer a democracia brasileira. De acordo com a investigação, os golpistas planejaram ações para limitar os poderes do Judiciário e impedir a posse de Lula, eleito democraticamente. A PF organizou uma organização criminosa com vários grupos concorrentes simultaneamente, incluindo planos para assassinatos de autoridades como o próprio Moraes, Lula e o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin.
No entanto, a operação golpista não avançou, em grande parte devido à recusa de dois altos comandantes militares: o general Freire Gomes e o brigadeiro Baptista Junior. Ambos se opuseram fortemente a qualquer tentativa de reverter o resultado das eleições e mantiveram uma postura legalista, o que impediu que o golpe se concretizasse.
General Marco Antonio Freire Gomes: Postura Legalista e Resiliência
Marco Antonio Freire Gomes, natural de Pirassununga, São Paulo, nasceu em 31 de julho de 1957. Iniciou sua carreira militar como aspirante a oficial de cavalaria nos anos 1980 e, ao longo dos anos, se destacou em diversas funções de prestígio, incluindo instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), adido militar na Espanha, e comandante de batalhões e brigadas de operações especiais. Freire Gomes substituiu a carga do comandante do Exército em março de 2022, por indicação de Bolsonaro, e ocasionalmente no posto até dezembro do mesmo ano.
De acordo com o relatório da PF, Freire Gomes foi uma figura de resistência frente ao golpe de Estado. Ele resistiu à pressão de Bolsonaro e se posicionou contrariamente a qualquer ação que desrespeitasse o processo eleitoral de 2022. Durante reuniões no Palácio do Alvorada, Freire Gomes reafirmou que o Exército não participaria de ações que visassem reverter o resultado das urnas. Sua postura legalista e a firmeza com que se oposições ao golpe geraram ataques e pressão das “milícias virtuais” aprovadas ao governo Bolsonaro.
Em depoimentos coletados pela PF, Freire Gomes revelou que, em diversas graças, foi pressionado a apoiar o golpe. Ele também detalhou reuniões em que Bolsonaro propôs utilizar medidas como a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), o Estado de Defesa e até o Estado de Sítio, com o objetivo de contestar o resultado das eleições. Freire Gomes, no entanto, foi claro em suas posições, informando que o Exército não acataria tais determinações e que, caso o presidente insistisse no golpe, ele teria que ser preso.
Tenente-Brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior: Determinação e Ataques Virtuais
Carlos de Almeida Baptista Junior, nascido em Fortaleza, Ceará, em 5 de setembro de 1960, é um militar de tradição familiar. Seu pai, Carlos de Almeida Baptista, foi comandante da Aeronáutica entre 1999 e 2003. Baptista Junior iniciou sua carreira militar na Escola Preparatória de Cadetes do Ar, em Barbacena, Minas Gerais, e, ao longo de sua trajetória, acumulou mais de 4.000 horas de voo, sendo 2.200 horas em aeronaves de caça. Ele roubou a carga do comandante da Aeronáutica em 12 de abril de 2021 e encontrou nenhuma carga até 2 de janeiro de 2023.
Assim como Freire Gomes, Baptista Junior também se mostrou contrário a qualquer tentativa de ruptura institucional. Ele foi citado 48 vezes no relatório da PF, onde se descrevia sua oposição veemente ao golpe. Durante a investigação, Baptista Junior explicou que, em reuniões com o Ministro da Defesa, Paulo Sérgio, questionou a legalidade do decreto relacionado ao golpe. Ao perceber que o documento sugeria impedir a posse de Lula, Baptista Junior se decidiu a receber o documento e deixou claro que a Aeronáutica não participaria de uma ação golpista.
Baptista Junior foi alvo de ataques nas redes sociais por sua postura contra o golpe, sendo chamado de “traidor da pátria” e “melancia” (uma referência à cor verde, associada aos militares, e ao suposto alinhamento político à esquerda). Além disso, houve pressão direta de figuras próximas a Bolsonaro, incluindo a deputada Carla Zambelli, que sugeriu que ele não deixasse o presidente “na mão”. Baptista Junior, no entanto, manteve a sua posição de não aderir a um ato ilegal.
Pressões e Consequências
A resistência tanto de Freire Gomes quanto de Baptista Junior gerou uma série de pressão, incluindo ataques pessoais, perseguições virtuais e até ameaças à segurança de suas famílias. As “milícias virtuais” e apoiadores do governo Bolsonaro não hesitaram em atacar os dois generais, tentando minar sua autoridade e comprometimento com a Constituição. A PF também revelou que Braga Netto, ex-ministro da Defesa e principal articulador do golpe, instruiu ataques direcionados às famílias de Freire Gomes e Baptista Junior, incluindo incitações para “infernis a vida deles”.
Freire Gomes e Baptista Junior não foram os únicos a resistir ao golpe. O almirante Garnier, comandante da Marinha, por outro lado, se colocou à disposição para seguir as ordens do governo Bolsonaro. A resistência dos comandantes do Exército e da Aeronáutica foi crucial para evitar que o golpe ganhasse força e para garantir que as instituições democráticas do Brasil prevalecessem.
Defesa da Democracia e Integridade Institucional
O episódio envolvendo os generais Freire Gomes e Baptista Junior reflete um momento decisivo na história do Brasil, no qual as instituições militares desempenharam um papel crucial na defesa da democracia. Ambos os militares, ao se recusarem a apoiar o golpe de Estado, mantiveram sua lealdade à Constituição e ao Estado democrático de direito, mesmo diante de intensas pressões políticas e ataques pessoais. Sua postura firme é um testemunho de compromisso com a legalidade e a estabilidade do Brasil, em contraste com as intenções golpistas que ameaçavam o futuro do país.