O mercado clandestino de aranhas no Brasil está se tornando uma verdadeira febre, especialmente entre jovens de classe média, e movimenta milhões de reais a cada ano. Embora seja ilegal criar e comercializar tarântulas e outras espécies de aracnídeos no país, esse mercado continua a crescer, impulsionado por uma combinação de curiosidade, vaidade e a facilidade de acesso a essas criaturas através de redes sociais e aplicativos de mensagens. A seguir, exploramos os aspectos mais alarmantes dessa prática ilegal, desde a venda online até os riscos ambientais envolvidos.
1. A Expansão do Mercado Ilegal de Aranhas
Nos últimos anos, o interesse por tarântulas e outras aranhas exóticas, tem aumentado, especialmente em plataformas como Facebook e WhatsApp, onde colecionadores trocam informações, compram e vendem espécies raras, e até promovem rifas. A venda de aranhas em grupos fechados de redes sociais tem gerado movimentações milionárias, com algumas espécies sendo comercializadas por valores que chegam a até R$ 1.200.
Formas de Comercialização:
- Venda Parcelada: Algumas espécies, especialmente as mais raras ou agressivas, são vendidas por meio de parcelamentos, tornando a prática acessível para um número ainda maior de pessoas.
- Rifas: É comum a realização de rifas online para “vender” aranhas, permitindo que mais pessoas participem do mercado de maneira mais barata.
- Grupos de WhatsApp e Facebook: Esses ambientes funcionam como pontos de venda, mas também de trocas de experiências entre os colecionadores. Nesses grupos, membros discutem sobre cuidados, criaçãos, e como transportar os animais sem chamar a atenção de autoridades.
2. A Facilidade de Acesso e a Falta de Fiscalização
A prática de criação de aranhas e outros animais silvestres em cativeiro, que é regulamentada por leis ambientais, enfrenta uma enorme falta de fiscalização. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), responsável pela proteção da fauna silvestre no Brasil, raramente realiza apreensões ou aplica multas. Em 20 anos, menos de 100 multas foram aplicadas em casos envolvendo aranhas, muitas das quais com valores baixos.
A ausência de ações efetivas por parte das autoridades contribui para a perpetuação dessa prática ilegal. Como apontam muitos colecionadores, a criação de tarântulas no Brasil raramente resulta em apreensões de grande escala ou ações rigorosas, o que estimula ainda mais o comércio clandestino.
3. O Perfil dos Colecionadores e a “Febre” do Hobby
A criação de aranhas, especialmente tarântulas, é um hobby que tem se popularizado principalmente entre os jovens de classe média, como relatado pelos próprios colecionadores. Muitos estão em busca da aranha mais rara, exótica ou agressiva, o que traz um elemento de vaidade para a prática. Algumas espécies de aranhas podem ser encontradas em diversas faixas de preço, mas as mais procuradas podem ultrapassar R$ 1.000, com a Phamphobeteus sp. sendo um exemplo.
Esse fascínio por animais exóticos tem gerado uma enorme demanda, com colecionadores dispostos a investir grandes somas para adquirir exemplares raros e exóticos. A vaidade em ter o “bicho mais diferente” se tornou um atrativo para muitos, principalmente em um mercado no qual é difícil encontrar fiscalização eficiente.
4. Impactos Ambientais e Legais da Comercialização de Aranhas
Além do impacto direto sobre as espécies, a captura e o tráfico de aranhas causam um grande desequilíbrio ambiental. A retirada de indivíduos do seu habitat natural, especialmente fêmeas, pode eliminar toda uma geração de animais, interrompendo o ciclo de reprodução da espécie e prejudicando o ecossistema como um todo.
Consequências Ambientais:
- Desbalanceamento Ecológico: Como predadores no topo da cadeia alimentar, as aranhas desempenham um papel essencial na regulação de populações de insetos e outros animais. Sua remoção pode afetar o equilíbrio natural.
- Risco de Extinção: Algumas das espécies mais traficadas são consideradas ameaçadas, e o comércio ilegal contribui para a diminuição da biodiversidade, colocando em risco a sobrevivência dessas espécies.
Consequências Legais:
- Criação Ilegal: A criação de aranhas como animais de estimação no Brasil é proibida por lei, e pode resultar em multas e até prisão, com pena de até um ano de detenção.
- Licenciamento de Criadouros: Embora o Brasil permita a criação de certos animais silvestres em cativeiro desde que registrado e autorizado por órgãos competentes, muitos criadouros não cumprem as normas necessárias para garantir a origem legal dos animais.
5. Diferença entre Comércio Legal e Ilegal de Aranhas
A legalidade de criar e vender aranhas depende de uma autorização do Ibama ou de órgãos estaduais, que devem assegurar que o animal foi adquirido de forma legal, sem prejuízo ao meio ambiente. A criação de aracnídeos para comercialização tem gerado controvérsias entre especialistas, com alguns argumentando que é uma forma de conservação, enquanto outros apontam os riscos de fugas e maus-tratos.
Criadouros Autorizados:
- Reserva Dracaena (RJ): Um dos poucos criadouros que possui autorização para criar e vender aranhas, com um programa de reprodução que visa garantir a sustentabilidade da prática.
- Exotic Pets (PR): Outro criadouro autorizado, embora este tenha alegado não realizar venda de aranhas, apesar de estar registrado.
6. O Papel das Redes Sociais e a Falta de Regulação
As plataformas digitais, como Facebook e WhatsApp, têm sido os principais facilitadores dessa prática ilegal, permitindo a venda de animais silvestres de forma discreta e sem o controle adequado. A Meta, proprietária do Facebook, afirmou que não permite conteúdos de compra, venda ou comércio de animais silvestres, mas enfrenta dificuldades para aplicar essas regras de forma eficaz.
Além disso, o WhatsApp não realiza moderação de conteúdos trocados entre os usuários, o que dificulta a fiscalização e permite que os traficantes se comuniquem livremente.
7. O Papel dos Especialistas e a Visão Crítica sobre a Criação de Aranhas
Especialistas, como o biólogo Sérgio Henriques e o professor Carlos Wehrs, apontam que a criação de animais silvestres, como as tarântulas, deve ser tratada com cautela. Henriques alerta para os impactos ambientais da coleta desses animais e critica a visão de que a criação de aracnídeos em cativeiro pode contribuir para a conservação das espécies.
Já Carlos Wehrs destaca que o simples ingresso em grupos para discutir sobre esses animais não configura crime, desde que não haja tentativa de venda ou incitação ao tráfico.
8. A Solução?
Embora o mercado clandestino de aranhas continue a crescer, a solução para combater esse problema não é simples. É necessário um esforço conjunto entre as autoridades, plataformas digitais e a sociedade para promover a conscientização sobre a ilegalidade dessa prática, melhorar a fiscalização e garantir que as espécies sejam preservadas em seus habitats naturais.
Além disso, é fundamental que a criação legalizada seja incentivada, desde que as normas de bem-estar animal e preservação ambiental sejam rigorosamente cumpridas.